O lodo resultante do esgoto em Curitiba está prestes a ser transformado em energia elétrica, para abastecer a própria estação de tratamento de água da capital paranaense. O processo de conversão de matéria orgânica em gases que podem gerar energia é antigo, mas o aproveitamento do lodo em grande quantidade é uma novidade.
Restos de alimentos, resíduos da pecuária e da agricultura e até dejetos são matéria orgânica que podem virar biogás. O processo, conhecido como biodigestão, aproveita a ação das bactérias que se alimentam dessas substâncias em ambientes sem oxigênio e transformam tudo em gases como metano, dióxido de carbono e oxigênio. Esses gases, quando injetados em grupogeradores, servem tanto para gerar energia térmica quanto eletricidade. Em uma estação de tratamento de água, as bactérias estão presentes e produzem os gases que, muitas vezes, acabam sendo liberados e causam danos ao meio ambiente.
Potencial
Por ter uma participação ainda pequena na matriz energética brasileira, o biogás – junto a outras fontes energéticas como o biodiesel – é classificado de biomassa. Segundo dados divulgados pela Empresa de Pesquisa Energética, no ano de 2015, a participação da biomassa no setor como um todo foi 8%. No entanto, o potencial dessa fonte de energia no país é bastante relevante: a Associação Brasileira de Biogás e Biometano (Abiogás) afirma que o Brasil produz 7 milhões de metros cúbicos (m³) de lodo por dia, 15 milhões de m3 de resíduos de alimentos e 56 milhões de m3 de sucroenergético por dia (produção de energia a partir de cana-de-açúcar).
Esse potencial foi identificado pela Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) em Curitiba, onde a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Belém recebe 840 litros de esgoto por segundo diariamente. Após o processo de tratamento, essa quantidade gera entorno de 600 metros cúbicos de lodo por dia.
Segundo o engenheiro da Sanepar Charles Carneiro, esse resíduo será depositado em biodigestores construídos próximo ao sistema de tratamento do esgoto, misturado a outros materiais orgânicos dispensados por grandes produtores de alimentos. O biogás produzido será transformado em energia elétrica por meio da usina com potência instalada de 2,8 mega-watts (MW), e o resíduo pós-digerido passará por uma secagem térmica para virar biofertilizante ou carvão. Esse material será usado no próprio processo de secagem.
O engenheiro Gustavo Possetti, da Assessoria de Pesquisa e Desenvolvimento da Sanepar, explica que com a implantação da usina de biogás todo o processo passa a ser sustentável. “Além de tratar o esgoto promovendo a saúde pública e a limitação de impactos ambientais, nós tentamos gerenciar da forma mais correta possível todos os subprodutos que advêm desse processo.”
O primeiro passo para a instalação da usina foi verificar o potencial de produção e das características do biogás das estações de tratamento. “A partir desse projeto geramos as primeiras diretrizes que poderiam orientar a recuperação energética desse material, em função das escalas das estações e consequentemente em função de cada uma das propostas de utilização”, conta Possetti.
Histórico
Antes de construir a usina em Curitiba, a Sanepar fez uma primeira experiência, em 2009, na ETE Ouro Verde, em Foz do Iguaçu. De acordo com o engenheiro, lá foi possível estudar as características da produção do biogás e adquirir experiência para compreender o processo de geração distribuída de eletricidade e do sistema de compensação. Isso viabilizou a efetivação da planta de biogás ainda maior, na ETE Belém, ligada à rede de distribuição da cidade, com possibilidade de gerar créditos para desconto na conta de luz da companhia.
A previsão é que a usina de Curitiba entre em funcionamento no segundo semestre de 2017, mas a energia deve começar a ser gerada efetivamente apenas 180 dias depois da inauguração, prazo necessário para que os biodigestores gerem gases suficientes para ligar as máquinas. Em uma segunda etapa, a planta de Biogás na Sanepar terá a capacidade instalada ampliada para 5,6 MW.
Agência Brasil