Entrevista com Júlio Cesar Minelli, Diretor-Superintendente da Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil (APROBIO).
Canal: Quanto de biodiesel é produzido a partir da soja?
Júlio Cesar: Em 2017, a soja foi a matéria-prima mais utilizada para produção de biodiesel no Brasil, com 71,6% do total. Em seguida, com 16,8%, vem a gordura animal, principalmente a bovina, mas também a suína e a de frango. Esse tipo de insumo cresceu 15,85% em comparação com 2016. Entre os demais materiais graxos utilizados na cadeia produtiva de biodiesel, merecem destaque o óleo de palma, com potencial de crescimento em regiões de zoneamento agroecológico, e o óleo de fritura usado, que em regiões como o Sudeste chega a responder por 7% da matéria-prima utilizada pela indústria de biodiesel. Os dados têm como fonte o Anuário Estatístico Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis 2018, publicado pela ANP.
Canal: Por que o grão é o mais adequado para essa produção?
Júlio Cesar: A ampla oferta de soja no Brasil, que compete ano a ano com os EUA o posto de maior produtor mundial do grão, é uma das explicações para a expressiva utilização na indústria de biodiesel, mas não a única. É preciso entender que a soja conta com uma complexa cadeia, com diversas formas de processamento e ampliação do valor dos produtos obtidos em comparação ao grão in natura.
Produzir biodiesel a partir de soja significa agregar valor a essa cadeia produtiva: com 1.000 kg de soja in grão, é possível obter 800 kg de farelo de soja, que vai se transformar em proteína animal como ração para a indústria frigorífica, e 200 kg de óleo de soja, um subproduto do farelo que se valoriza com a sua transformação em biodiesel.
A Aprobio é entusiasta da ampliação das matérias-primas utilizadas pelo setor de biodiesel, como uma maior participação das palmáceas e programas estruturados de reciclagem de óleo de fritura usado – ao destinar 1 litro de óleo de cozinha para a reciclagem, em vez de jogá-lo na rede de esgoto, poupa-se o custo de tratamento de 25 mil litros de água, segundo dados da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo).
Canal: Qual a segunda matéria-prima mais utilizada no Brasil para produção de biodiesel?
Júlio Cesar: A gordura animal, principalmente a bovina, é o segundo principal insumo do biodiesel brasileiro, o que também se reverte em significativo benefício ambiental e econômico. Com a utilização do sebo, agrega-se valor ao que antes era considerado resíduo de difícil destinação adequada. Em outras palavras, o que antes era um passivo ambiental passa a ter preço de mercado e utilidade econômica.
Canal: Esse uso deve se manter nos próximos anos? Há de se falar em novas matérias-primas?
Júlio Cesar: Uma das matérias-primas do biodiesel com maior potencial de crescimento no Brasil é a palma de óleo, principalmente na região Norte. Mas é fundamental compreender que, ao contrário do que ocorre em países do Sudeste Asiático, no Brasil esse cultivo é um ativo social e ambiental. O país estabeleceu normas para o cultivo das palmáceas por meio do zoneamento agroecológico, que prevê a recuperação de áreas previamente degradadas com a implementação de áreas de extrativismo, com inclusão social das famílias que vivem nessas regiões. Para a Aprobio, há um significativo potencial de crescimento desse tipo de matéria-prima, que inclui não só a palma de óleo (o conhecido dendê), mas também macaúba, babaçu e outras espécies nativas.
Canal: Quais as estatísticas de produção atuais e qual a estimativa para 2019?
Júlio Cesar: Com a entrada em vigor do B10 (10% de adição de biodiesel ao diesel derivado de petróleo) em março passado, 2018 deve ser o ano de maior produção e consumo de biodiesel na história do Brasil, com 5,4 bilhões de litros. Trata-se de um aumento de 25% em relação a 2017, quando foram registrados 4,3 bilhões de litros. A partir de 2019, as perspectivas são de novo crescimento, em função de resolução recém-aprovada pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que estabelece um cronograma de aumento de 1 ponto porcentual do biodiesel adicionado ao diesel fóssil até o limite de 15% (B15), a ser atingido em 2023. Dessa forma, estima-se que no próximo ano a produção nacional de biodiesel se aproxime dos 6 bilhões de litros e, caso a economia brasileira retome o crescimento, o mercado deve dobrar de tamanho nos próximos cinco anos, aproximando-se dos 11 bilhões de litros de biodiesel em 2023.
Canal-Jornal da Bioenergia