Etanol em baixa, açúcar é a esperança
Canal – Quais os efeitos da crise imposta pela pandemia do novo coronavírus no setor?
Antonio de Padua – A pandemia trouxe questões como a quebra de contratos, falta de competitividade do etanol no mercado de combustíveis e a redução no consumo. Esses efeitos, combinados com a guerra comercial entre russos e sauditas que já estava em andamento, formaram uma tempestade perfeita no setor sucroenergético.
Somente na primeira quinzena de abril, a receita com a venda de etanol caiu quase 50% em relação ao mesmo período em 2019. No mês, contabilizamos um recuo de 38% das vendas. Ainda não conseguimos mensurar todos os impactos, pois são muitos fatores, mas trata-se de uma grave crise.
Canal – Quais os principais pontos negativos?
Antonio de Padua -Sem dúvida, o principal efeito causado pela pandemia do coronavírus foi a grande redução no consumo de etanol, principalmente por causa da diminuição do tráfego de veículos leves. Com o cenário da queda de preço, por conta da disputa entre a Arábia Saudita e a Rússia, num primeiro momento, e em seguida o anúncio da pandemia pela OMS, houve uma nova queda de demanda do petróleo a nível mundial. Isso se refletiu no Brasil antes mesmo da pandemia, mas depois piorou consideravelmente. Houve queda expressiva de demanda de combustível do ciclo otto. Boa parte do setor continua com uma fragilidade financeira, sem capital de giro, e temos como característica desembolsar 70% de nosso faturamento durante a safra. Há também a questão da cana ser um produto muito perecível, que não pode ser mantido no campo. Sem recursos para estocagem, em pouco mais de um mês o setor teria que parar a moagem, o que geraria um problema muito sério na cadeia produtiva.
Canal – O que precisa ser feito para atravessar esse ano e mitigar os efeitos negativos para o negócio? O que depende do governo? E o que o próprio setor pode fazer?
Antonio de Padua – Há medidas em discussão com o governo federal, entre elas a principal é uma linha de warrantagem, ou seja, concessão de crédito usando estoques de etanol como garantia. A medida precisa ser desenhada pelos bancos, com estabelecimentos de critérios e condições.
O próprio setor já está mudando o que pode para mitigar os efeitos, com o incremento na produção de açúcar e uso de tancagem. Contudo, nem todas unidades produtivas dispõem dessas alternativas.
O setor não é homogêneo. Temos empresas que aproveitaram o momento de bons preços do açúcar fazendo hedge tanto para açúcar quanto para etanol. Muitas empresas precisam rever seu processo de gestão, buscando eficiência e produtividade para serem mais competitivas.
Canal – E o futuro? Como planejar para o pós-crise?
Antonio de Padua -Pretendemos continuar com os projetos em andamento, focando no novo mercado de Cbios, do programa RenovaBio, e manter o ritmo de produção de antes da pandemia.
Canal – Que lição tirar dessa situação atual?
Antonio de Padua – Em meio a essa situação desafiadora para a sociedade como um todo, algo que se destacou foi a solidariedade. Diversas entidades, tanto públicas como privadas, realizaram ações em benefício da população. O setor sucroenergético se mobilizou. As empresas associadas à UNICA doaram 1 milhão de litros de álcool 70% às Secretarias de Saúde de nove estados. Somam-se a isso inúmeras iniciativas no âmbito municipal de doação de insumos e alimentos. Estamos fazendo nossa parte para que o Brasil consiga superar essa pandemia da melhor forma possível.