Uma pesquisa de Iniciação Científica (IC) desenvolvida no Campus Araras da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) identificou um marcador molecular – espécie de assinatura genética – de cultivares de cana-de-açúcar resistentes à ferrugem alaranjada, doença importante nessa cultura, causada por fungo que se espalha pelo ar. Com isso, o estudo indicou que esta pode ser uma ferramenta molecular importante na busca por novas cultivares resistentes à doença.
O trabalho foi realizado por Ícaro Fier, graduado em Biotecnologia pela UFSCar, sob orientação de Monalisa Sampaio Carneiro, docente no Departamento de Biotecnologia e Produção Vegetal e Animal (DBPVA-Ar) da Instituição.
“Em um primeiro momento, avaliamos, em campo, a resistência à ferrugem alaranjada dessas cultivares. Depois, verificamos a frequência do marcador G1 junto às cultivares, para analisarmos se esse marcador auxilia em uma resistência ainda maior a esta ferrugem”, sintetiza Carneiro.
A pesquisa constatou que o marcador molecular G1, antes testado apenas em cultivares de cana originárias dos Estados Unidos, é, também, fator de resistência à ferrugem alaranjada em 10 das 24 cultivares brasileiras testadas. Este é o primeiro estudo do País que analisa o marcador em cultivares brasileiras.
Os resultados mostraram que a eficiência do marcador G1 em prever a resistência foi de 71,43%. Além disso, na média geral, a redução na severidade da doença foi de 35% quando o marcador G1 estava presente.
A ferrugem alaranjada é causada pelo fungo Puccinia kuehnii e acomete as folhas, que ficam cheias de pontos alaranjados. A doença prejudica a fotossíntese e reduz, portanto, a produtividade da cana-de-açúcar. Diferentemente de uma bactéria, por exemplo, em que é possível ter maior controle do ambiente para evitar proliferação, o fungo é facilmente espalhado pelo ar – por isso a importância de se criar cultivares resistentes a ele.
A integração de dados de campo com o marcador G1 permitiu a identificação de cultivares de cana resistentes à ferrugem alaranjada, sendo que essa resistência foi promovida, em parte, pelos genes aos quais o marcador G1 está ligado. As cultivares resistentes e com a presença do marcador G1 podem ser aproveitadas no processo de melhoramento para realizar novos cruzamentos e, assim, obter cultivares que combinem também esse tipo de resistência à ferrugem alaranjada, criando o que os cientistas chamam de resistência durável.
“Essa resistência durável é um dos objetivos do nosso programa de melhoramento genético – o maior do País -, pois vem com o propósito de liberar cultivares resistentes às principais doenças da cana-de-açúcar, tendo, assim, maior durabilidade comercial e boas condições de produtividade”, conta a docente da UFSCar.
Outra vantagem: cultivares mais resistentes diminuem o uso de produtos químicos para combater doenças – algo prejudicial à própria cana e ao ambiente.
A pesquisa foi desenvolvida no âmbito do Grupo de Estudos em Biotecnologia de Plantas (GEBPlant), coordenado por Carneiro, com apoio do Programa de Melhoramento Genético da Cana-de-açúcar da UFSCar (PMGCA), sediado no Centro de Ciências Agrárias (CCA), no Campus Araras.
Premiação e reconhecimento
Parte do estudo gerou a publicação “Field resistance and molecular detection of the orange rust resistance gene linked to G1 marker in Brazilian cultivars of sugarcane” (https://doi.org/10.1590/0100-5405/221803), que conquistou o Prêmio Summa Phytopathologica, como melhor artigo publicado no ano de 2020 no periódico de mesmo nome.
Além de Fier e Carneiro, o texto tem coautoria de Hermann Paulo Hoffmannn – assim como Carneiro, docente no DBPVA-Ar -, além de Thiago Willian Almeida Balsalobre e Roberto Giacomini Chapola, pesquisadores no PMGCA e integrantes da Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroenergético (RIDESA).
Fier, hoje estudante de doutorado no Programa de Pós-graduação em Genética e Biologia Molecular na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), comenta que a premiação trouxe a ele um incentivo pessoal, além de corroborar a importância do trabalho que os cientistas desenvolvem diariamente.
“Como profissional da área, vejo a Biotecnologia como um racional que permite criar tecnologias aplicáveis em diversas áreas. Na Agronomia, por exemplo, ela pode potencializar o desenvolvimento de cultivares mais adaptadas para as necessidades atuais. O período em que passei no GEBPlant ajudou a estruturar a minha base de conhecimentos que me impulsionaram na carreira acadêmica. Hoje, como aluno de doutorado da Unicamp, fico feliz em saber que nossos esforços geraram frutos”, pontua o estudante. UFSCar