A descontinuidade de políticas públicas que garantam mais competitividade ao biocombustível da cana ou a criação de medidas que privilegiem a maior utilização de energias fósseis no setor de transportes podem prejudicar o alcance das metas de desenvolvimento sustentável assumidas pelo Brasil até 2030. O País se comprometeu, neste prazo, a cortar em 43% suas emissões de gases de efeito estufa (GEEs). Foi uma das obrigações mais ambiciosas assumidas durante a COP21, em Paris.
O diretor Técnico da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), Antonio de Padua Rodrigues alerta para os riscos do não cumprimento de alguns pontos da proposta brasileira, também conhecida como pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada (INDC). O executivo, além de sublinhar implicações negativas de incentivo às energias fósseis, acrescenta que será necessário dobrar a atual oferta de etanol dos atuais 28 para 50 bilhões de litros. “Isto demandará investimentos de aproximadamente US$ 40 bilhões nos próximos 14 anos. Para tanto é primordial, desde já, que programas e políticas públicas valorizem cada vez mais o uso de energias renováveis em vez das fósseis. Do contrário, significará um enorme contrassenso”, afirma.
O diretor da UNICA não tem dúvidas sobre o potencial do biocombustível de cana para a efetivação da INDC brasileira, mas demonstra preocupação com algumas iniciativas que podem minar a expansão de energias limpas, especialmente no setor de transportes, como o Projeto de Lei em tramitação no Congresso Nacional, que autoriza a fabricação, em grande escala, de veículos leves movidos a diesel.
Padua lembra medidas que trouxeram mais competitividade ao etanol, que acabou substituindo mais de 37% do consumo nacional de gasolina em 2015. “Ações como o aumento da mistura de etanol anidro à gasolina C, até 27%, e mudanças tributárias em relação ao combustível fóssil, como a elevação do ICMS em determinados Estados e retorno parcial da Cide vieram nesta direção”, ressalta.
Frota mais sustentável
Pioneiro na execução de um amplo programa de substituição de combustíveis fósseis por um biocombustível produzido a partir da cana, fonte renovável, o Brasil possui hoje uma das frotas automotivas menos poluentes do planeta. Na categoria dos veículos leves, são mais de 25 milhões rodando com etanol (anidro e hidratado), o que representa aproximadamente 68% da frota de carros de passeio em circulação. Todos os anos, o consumidor pode escolher entre mais de 200 modelos flex produzidos por 19 montadoras instaladas no País.
Desde que os automóveis bicombustíveis aportaram no mercado nacional, em março de 2003, o consumo do biocombustível misturado à gasolina ou 100% puro já evitou a emissão de quase 352 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera. Segundo a ONG SOS Mata Atlântica, para mitigar este volume seria necessário o plantio e manutenção de mais de 2,5 bilhões de árvores nativas ao longo de 20 anos.
Já entre os veículos mais pesados, o País ensaia o mesmo sucesso. Isso porque a maior metrópole da América Latina, a cidade de São Paulo, é hoje referência no Brasil e no mundo ao adotar dois combustíveis renováveis oriundos da cana no transporte público. Na capital paulista, rodam mais de 400 ônibus abastecidos com até 30% de diesel de cana e 58 coletivos movidos com 95% de etanol e 5% de um aditivo especial.
Em relação aos coletivos movidos a óleo diesel, a redução na emissão de material particulado na atmosfera, a chamada fumaça preta, pode atingir a faixa de até 30% com o uso do biocombustível sucroenergético. Os ônibus movidos a etanol, além de cortarem em até 90% a emissão de particulado, emitem 80% menos gases responsáveis pelo aquecimento global. Reduzem em 62% a emissão de óxido de nitrogênio (NOx), sem liberar enxofre, substância causadora de chuva ácida.
A sustentabilidade também está no foco de empresas comprometidas em reduzir os impactos ambientais gerados pelo transporte de carga. Recentemente, a Clariant, uma das líderes da indústria química, adquiriu três caminhões da Scania movidos a etanol, os primeiros da América Latina. Os veículos entraram em operação na primeira quinzena de maio deste ano (12/05). UNICA
Veja Também
Bioquerosene de aviação, nova fronteira para o etanol de cana
A avaliação positiva da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em …