O que era “exigência” de adaptação do setor agropecuário por um plano para redução de emissão de carbono virou “estímulo” para que segmento corte emissões.
A bancada ruralista no Congresso Nacional conseguiu, no ano passado, a exclusão do agronegócio do Projeto de Lei que regulamenta o mercado de carbono no Brasil, decisão que dividiu especialistas. Mas não há limites para os agro-parlamentares em seu trabalho de livrarem o setor de suas obrigações climáticas, é um dos principais responsáveis pelas emissões brasileiras, seja pelo metano da pecuária, seja pelo desmatamento que o “ogronegócio” estimula.
A mais nova empreitada se dá no Projeto de Lei 4.129/2021, que estabelece diretrizes e critérios gerais para a formulação e a implementação dos planos nacional, estaduais e municipais de adaptação às mudanças climáticas. Segundo a Folha, a bancada ruralista quer não apenas reduzir as obrigações do agronegócio na proposta, como quer inserir a possibilidade do setor receber por “serviços ambientais e ecossistêmicos”.
O texto, relatado pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE), foi aprovado na Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado na semana passada. Dessa forma, o PL está pronto para ir ao plenário da Casa. Mas a bancada ruralista apresentou um requerimento para que o projeto seja antes apreciado pela Comissão de Agricultura (CRA) – na qual o grupo tem ampla maioria.
Já na CMA, que também tem boa parte de seus parlamentares ligados ao setor, os ruralistas emplacaram uma emenda para reduzir as responsabilidades do agronegócio. O projeto original exigia a adaptação do setor agropecuário por meio de um plano para redução de emissão de carbono. Após pedido do senador Zequinha Marinho (PL-PA), a redação foi alterada.
Assim, a exigência foi retirada, e o texto passou a prever, genericamente, que haverá um “estímulo” (ligado a investimentos em pesquisa e desenvolvimento, por exemplo) para que o setor corte suas emissões. Mas não especifica se o estímulo inclui recursos públicos.
Marinho também queria que o projeto de adaptação climática criasse a previsão de “pagamento por serviços ambientais e ecossistêmicos” para o agronegócio. Esse trecho, porém, não foi aceito pelo relator. O que pode ocorrer na CRA, ainda mais com o amplo domínio da bancada ruralista.
Líder da área de mudanças climáticas do WWF Brasil, Alexandre Prado lembra que um dos principais desafios do país é reduzir as emissões ligadas ao uso da terra, e que as mudanças climáticas já impactam até mesmo o próprio agronegócio. Ainda assim, ele avalia que as alterações não chegam a invalidar o cerne do PL 4.129. “Não faria disso um cavalo de batalha. Esse projeto, se for para votação, está de bom tamanho”, analisou.
ISA e Sagres também trataram da votação do PL da adaptação climática na Comissão de Meio Ambiente do Senado.
Em tempo: Produtores agrícolas de todo o país estão sentindo na pele – e em suas culturas – os efeitos das mudanças climáticas que o próprio agronegócio ajudou (e ainda ajuda) a piorar. E apesar de toda a sua preocupação com sustentabilidade e justiça social no campo, o MST não está imune às consequências dos erros alheios. Assim, o maior produtor de arroz orgânico da América Latina está sofrendo com perdas nas lavouras por causa das tempestades extremas que atingiram o Rio Grande do Sul nos últimos meses de 2023. O MST prevê que a safra deste ano será menor por causa dos eventos climáticos recentes, mas só conseguirá colocar as perdas no papel depois de abril, informa o UOL. ClimaInfo