O aproveitamento de água da chuva para irrigação garante ao produtor que, mesmo em períodos de forte seca, a lavoura não seja prejudicada. Há segurança hídrica e também vantagens econômicas e ambientais, tendo em vista que a conservação do solo evita a erosão e a morte do rio por assoreamento. Outro fator que contribui para a utilização dessa técnica é a má distribuição e a irregularidade dos índices pluviométricos no Brasil, os quais resultam na escassez de água em muitas regiões.
As características das chuvas de determinada região, intensidade, duração e frequência são grandezas indispensáveis para o dimensionamento das estruturas de captação e armazenamento da água, assim como as propriedades do solo e a declividade do terreno. É isso o que explica Henrique de Oliveira, doutor em Engenharia de Água e Solo e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Irrigação no Cerrado do Instituto Federal Goiano Campus Ceres.
“Visando a utilização correta das águas pluviais, faz-se necessário um planejamento de uso das terras, evitando-se perdas excessivas por escoamento superficial, ao mesmo tempo em que se cria condições favoráveis para que a água infiltre no solo. O uso adequado, além de garantir o suprimento de água para as culturas, é de fundamental importância no controle de perdas de solo e água em áreas agriculturáveis”, aponta Henrique.
Dentre as técnicas utilizadas para aumentar a infiltração e armazenamento de água no solo, ele destaca as de caráter vegetativo e edáfico, além da intervenção mecânica.
As técnicas de caráter vegetativo mais utilizadas são florestamento e reflorestamento, plantas de cobertura, cobertura morta, rotação de culturas, formação e manejo de pastagem, cultura em faixa, faixa de bordadura e quebra vento. Dentre as técnicas de caráter edáfico, destaca-se o cultivo de acordo com a capacidade de uso da terra e a adubação verde.
No caso das técnicas mecânicas utilizadas para aumentar a infiltração e armazenamento de água no solo, podem ser citados o preparo do solo e plantio em nível, sulcos e camalhões em pastagens, enleiramento em contorno e o terraceamento. Destacam-se ainda os miniaçudes sucessivos, os quais coletam a água das chuvas, contendo a força erosiva das enxurradas, funcionando como um tanque de armazenamento, o qual permite a infiltração gradual da água, propiciando recarga do lençol-freático.
Henrique ressalta que “as técnicas apresentadas são de extrema importância para que seja possível a manutenção de lavouras irrigadas, sem que haja alterações sistemáticas na disponibilidade hídrica das fontes utilizadas.” Mantendo os níveis adequados das fontes hídricas e respeitadas as condições de solo, clima e planta, qualquer sistema de irrigação poderá ser utilizado para fornecimento de água no momento e na quantidade certa aos cultivos, destacando-se atualmente os sistemas de irrigação localizada (gotejamento e microaspersão), por aplicarem água em baixo volume e alta frequência, diretamente na zona radicular, sem sofrer grande influência do vento.
Daniel Pedroso, coordenador agronômico da Netafim, diz que existem três tipos de irrigação: a irrigação de salvamento, que é aquela que fornece água para a planta para mantê-la viva; a irrigação deficitária, que é aquela que se conhece a necessidade hídrica da planta, no entanto, apenas se fornece uma parte dessa necessidade; e a irrigação plena, que é aquela que se conhece e fornece à planta toda a sua necessidade hídrica. O professor de irrigação e degenerem na Universidade Estadual Paulista (Unesp) Ilha Solteira, Fernando Tangerino, explica que, do ponto de vista da agricultura, há duas maneiras de se aproveitar a água da chuva: por meio do barramento e técnicas de conservação do solo. A primeira ocorre quando a água chega ao solo ou infiltra e abastece o lençol freático, já a segunda é por meio do escoamento superficial – não há como acontecer sem erosão. “Devemos adotar técnicas que retenham a água na bacia hidrográfica seja represamento ou infiltrando no solo.”
Conforme explica o professor, as técnicas não são excludentes, mas complementares. Com a construção de barragem, a água da chuva é armazenada na propriedade e utilizada assim que for necessário. Já quando se promove infiltração, a água é infiltrada no solo e volta em forma de nascente, podendo ser utilizada ao longo do ano e garantindo a estabilidade do barramento.
Vantagens
O custo/benefício de cada modelo de irrigação é variável e particular de cada tecnologia. “Há equipamentos que possuem um alto custo inicial, no entanto, os gastos por milímetro aplicado e o custo por tonelada de matéria-prima produzida é muito menor que os demais, que é o caso do gotejamento. E há tecnologias que o custo inicial (capex) é menor que os demais equipamentos, mas o custo operacional é muito maior, como os auto propelidos e a aspersão” explica Daniel Pedroso, coordenador agronômico da Netafim.
Daniel aponta que a economia para o produtor depende de qual o regime pluviométrico da região, associado com a necessidade hídrica da cultura. “Podemos estimar que em torno de 20% a 30% de economia pode ser realizada. Vale lembrar que há métodos que utilizam mais água e outros, mais inteligente, que utilizam menos água.
A economia com o armazenamento da água da chuva está intimamente ligada com a escolha do equipamento da irrigação. A literatura diz que a eficiência de aplicação de um auto propelido e aspersão é em torno de 75%, dos pivôs 85% e gotejamento 95%. Escolher um método com mais eficiência é certeza de maior economia de água.” Várias culturas têm se beneficiado do aproveitamento da chuva para irrigação. “Há um crescimento muito grande de culturas extensionistas, como a soja, milho, feijão e cana de açúcar. Os produtores dessas culturas estão chegando à conclusão de que é muito mais rendável investir em produtividade do que adquirir mais terras”, pondera Daniel. Segundo ele, o melhor meio de se aumentar a produtividade é com irrigação, principalmente com aquelas que utilizam a água de forma inteligente. Outra vantagem, de acordo com Henrique de Oliveira, está relacionada à garantia da sustentabilidade dos cultivos irrigados, ao mesmo tempo em que gera maior renda ao produtor rural, dado a economia dos insumos produtivos, bem como aumento na produtividade, tornando a atividade mais lucrativa e menos dispendiosa.
Cristalina é referência em agricultura irrigada
A cidade de Cristalina, em Goiás, é referencia nacional quando se fala em agricultura irrigada. O município possui a maior área irrigada da América Latina, com mais de 50 mil hectares. O armazenamento se dá, principalmente, por meio de barragens, que ficam cheias no período de chuvas, que se inicia em outubro e segue até o início de maio. No período de seca, essa água é utilizada para manter as plantações de culturas variadas no local.
Alécio Maróstica, da Associação dos irrigantes do Estado de Goiás, relembra que, antes da utilização dessa técnica, havia na região cinco tipos de cultura. Hoje já são 40. “A irrigação permite isso e faz com que se tenha um agricultura mais previsível. Dessa forma, temos a água preservada. Mesmo que não chova, o produtor pode começar a plantar.”
A produtividade aumenta e a previsibilidade também, o que gera retornos positivos nos campos econômico e social. “Nós não precisamos ficar desesperados nos meses de seca. Precisamos ter melhor modelo de gestão da água e buscar amparado de conhecimento técnico”, diz Alécio.
Com relação aos investimentos, Alécio considera que são baixos, feitos a longo prazo e podendo ser realizados de maneira coletiva. “Quem entra no setor de irrigação não acha o investimento caro. Um investimento é caro quando ele não se paga. Hoje, quando há irrigação, a produtividade, às vezes, é o dobro.” O custo é de aproximadamente R$10 mil por hectare. “O investimento se paga em, no máximo, 10 anos. Os pivôs duram cerca de 15 até 30 anos, em média”.
Ana Flávia Marinho-Canal-Jornal da Bioenergia