Antonio de Padua Rodrigues é membro da equipe da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) desde 1990. Em 2003 assumiu o cargo de diretor técnico que desenvolve até hoje. Ele foi coordenador de Administração e Finanças do Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-Açúcar (Planalsucar) e supervisor Administrativo-Financeiro dos projetos financiados pela Secretaria de Tecnologia Industrial (STI) do Ministério da Indústria, Comércio e Tecnologia (MICT).
Em 1983, implantou junto aos fornecedores de cana o Sistema de Pagamento de Cana por Teor de Sacarose (SPCTS), junto ao qual atuou como consultor até 1990. É bacharel em Administração de Empresas pela Faculdade de Administração de Empresas, Serviço Social e Educação de Americana (SP), com especialização em Administração de Projetos na Faculdade de Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo.
Canal: Qual a avaliação da Unica do ano de 2017?
Padua: Em 2017 tivemos um cenário diferente do ano anterior. Até certo ponto foi positivo, mas não para todas as empresas, e sim para grande parte. O primeiro ponto é a condição climática, que variou muito durante o período. Tivemos um ano com índice de chuva acima da média, que atrapalhou um pouco a moagem. Em seguida entrou um veranico muito forte, deixando algumas regiões com até 120 dias sem chuvas. E, partindo da premissa que estamos operando com um canavial acima da idade média e envelhecido isso impactou na produtividade agrícola. Assim, a safra atual – que deve ter moagem até março de 2018 – será menor na ordem de 14 milhões de toneladas de cana. No ano anterior a moagem foi de 607 milhões de toneladas e este ano pode chegar a 593 milhões de toneladas. Neste mês estamos com 583 milhões de toneladas, mas ainda há cana para ser moída.
Canal: Essa redução significa menos produto no mercado?
Padua: Não. Por outro lado a condição climática ajudou na maturação da cana. Em produto temos a mais 3,5 quilos de ATR por tonelada de cana nesta safra. Então, houve redução da moagem, mas com incremento da produção de açúcar e de etanol. Em termos de produção, neste momento, temos uma redução de 1,63% da moagem, um aumento de 1,65% na de açúcar e 1,13% na produção de etanol. Assim, em termos de produto o resultado foi positivo.
Canal: Quais as características desta safra?
Padua: A safra também teve duas características completamente diferentes do que produzir com essa cana. Ela começou muito forte na produção de açúcar, dado que os preços no começo do ano, em especial nos meses janeiro, fevereiro e março, estavam em alta. Muitas empresas negociaram o açúcar na bolsa. E essa produção forte de açúcar seguiu até meados de agosto, fim de setembro.
Após este período, as empresas mudaram o perfil de produção, reduzindo o açúcar e aumentando o etanol. Esse novo comportamento se deve a competitividade do etanol que houve no mês de julho, quando o Governo Federal mudou os tributos da gasolina e do etanol. Com essa alteração, houve aumento da competitividade do etanol e, ao mesmo tempo, desenvolve-se uma nova política de preço. Assim, o aumento do preço do petróleo e da gasolina no mercado internacional fez com que o etanol ganhasse mais espaço.
Enfim, tivemos dois momentos diferentes. Um primeiro com mais açúcar e o segundo com mais etanol.
Canal: Quais as perspectivas para 2018?
Padua: A princípio continua muito negativa devido ao preço do açúcar, que permanece muito baixo, graças ao incremento de oferta pelo Paquistão, Tailândia e China. Por isso, o Brasil não deve mudar o seu perfil de produção, devemos ter novamente uma redução da oferta de cana com um canavial bem envelhecido, mas com o mercado positivo para o mercado.
Não se vê em curto prazo uma mudança de preço do petróleo e dos preços internos da gasolina. Então, com esse cenário estável é evidente que a opção do produtor brasileiro será reduzir a produção de açúcar e transformar esse açúcar em etanol. A expectativa é uma safra mais alcooleira. Com o Brasil reduzindo a produção de açúcar, o etanol hidratado continua como o produto de maior viabilidade. Por isso, já se espera um aumento de incremento de combustível para o próximo ano.
O consumo de combustível do ciclo Otto retrocedeu. Mas o cenário de vendas de carros melhorou e trouxe uma nova e melhor perspectiva. Com isso, se espera ter uma maior demanda de combustíveis do ciclo Otto, isto é, mais espaço para o etanol ocupar seu share de mercado.
Hoje praticamente 85% das vendas de etanol no Brasil estão concentrados em cinco estados – São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás -, onde tem uma política tributária que favorece o etanol em relação à gasolina.
Por isso, será direcionado mais caldo para a produção de etanol do que açúcar. Na última safra a produção de açúcar foi de 39 milhões de toneladas. Deve-se reduzir de 3 a 4 milhões toneladas a produção deste produto em relação ao ultimo ano, chegando a 35 a 36 milhões de toneladas, e não deve ter alteração na produção de etanol.
Canal: Quando o RenovaBio começará a ter efetividade?
Padua: Primeiro depende de todo um processo de definição de metas. A lei fala de seis meses para defini-las, mas ainda não saiu o decreto constituindo dos grupos que vão trabalhar com estas metas, além de 18 meses para fazer a regulamentação. Ocorrendo tudo dentro da normalidade, a nossa experiência crê que deve começar antes, mas para valer apenas em janeiro de 2020.
Canal: E até essa definição o setor seguirá firme?
Padua: Claro, sem dúvida. O Proálcool acabou em 1985 e a produção de etanol nunca parou. Ela vai continuar, pode ficar internada por certo tempo, mas uma hora será reformada. O programa do governo parte da premissa da previsibilidade, não veremos grandes mudanças em curto prazo. É um cenário para 2025, 2030. As empresas terão que ver o que é importante, a regulamentação, entender como funcionará o mercado de papel – o CBIO (Crédito de Descarbonização). O mercado físico não sofrerá alteração, continuará o que é hoje, o consumidor vai à bomba e compra o etanol.
Mas o mercado de papel terá um novo valor. Ainda é muito cedo para se mensurar valores. Mas se eu tenho um papel para vender e outro tem que comprar para bater as suas metas, parte do princípio que ele valerá alguma coisa. Assim, este valor será incorporado ao preço do etanol, mudando também, de forma indireta, a precificação do açúcar.
Canal: As políticas públicas atuais para o setor estão satisfatórias?
Padua: Desde que sejam regulamentadas e implantadas, sim. O RevovaBio foi uma lei aprovada, mas deve-se manter a sequência dos processos.
Cejane Pupulin-Canal-Jornal da Bioenergia