Cogeração: ainda muito a crescer

Zilmar José de Souza é Gerente de Bioeletricidade da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica). Formado em Economia pela FEARP-USP, possui mestrado em Economia pela ESALQ-USP e doutorado em Engenharia de Produção pela UFSCar. Terminou o pós-doutorado em 2006, em Economia, pela FGV-SP.

Integra o time da Unica desde novembro de 2008, para dar suporte nos assuntos relacionados à bioeletricidade. Tem experiência profissional em empresas como Banco Itaú, CPFL, Energias do Brasil, e no governo do Estado de São Paulo (Agência Reguladora de Saneamento e Energia), atuando nas áreas de auditoria interna e regulação econômico-financeira. Trabalhou também em várias faculdades e universidades: Mackenzie, Oswaldo Cruz e, por último, atuava como professor e pesquisador do Departamento de Economia Rural da UNESP – Jaboticabal, nas áreas de agroenergia e finanças.

Canal – Jornal da Bioenergia: Qual a relevância da cogeração para o setor sucroenergético?

Zilmar José de Souza: Trata-se do terceiro produto mais relevante do setor sucroenergético. Ano passado, a geração para a rede foi de 22,4 mil GWh comercializados em contratos de venda muito deles em médio e longo prazo de duração, com receita reajustada pelo IPCA, o que ajuda bastante a dar estabilidade no portfólio de receitas do setor sucroenergético como um todo.

Canal- Atualmente qual a capacidade instalada em usinas de cogeração movidas com cana?

Zilmar: A biomassa em geral gera 15.111 MW  – 8,9% da matriz elétrica. Mas só a proveniente da cana representa 6,8% da matriz elétrica ou 76,4% da biomassa em geral, o equivalente a 11.543 MW, que é mais que a Usina Hidrelétrica Belo Monte, instalada no rio Xingu, no Pará. Confira no gráfico 1.

Canal: Qual o potencial de produção do setor?

Zilmar: Aproveitamos apenas 15% do potencial. Se houvesse o aproveitamento pleno da biomassa presente nos canaviais, a bioeletricidade teria potencial técnico para chegar a 142 TWh de oferta ao Sistema Interligado Nacional (SIN). O que representa

quase sete vezes o volume  ofertado em 2018, o que representaria atender 30% do consumo de energia elétrica no Brasil.

Canal: Quanto hoje é gerado?

No ano de 2019, o setor sucroenergético produziu 22,4 TWh para a rede nacional – o equivalente a quase 5% do consumo nacional de eletricidade no ano.  Porém, o crescimento não tem sido representativo nos últimos seis anos.

O estado de São Paulo se destaca, com a geração de 12.189 GWh, seguido por Mato Grosso do Sul (4.511 GWh), Minas Gerais (3.421 GWh) e Goiás (2.795GWh).

Canal: Quantas usinas na região Centro-Sul do país produzem energia?

Zilmar: O Brasil tem 405 usinas termelétricas (UTE) à base de biomassa. Apenas na região Centro-Sul concentra-se 85% do número de termelétricas à biomassa de cana e 92% da capacidade instalada do setor.

Segue gráfico com  a potência por unidade da federação. Os dados são da UNICA, a partir de Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Canal: E os projetos? Devido as atuais políticas, como RenovaBio, se vê um incremento por parte das usinas em adicionar a cogeração no quadro de produtos?

Zilmar: O setor sucroenergético está ajustando o perfil de alavancagem e de endividamento, acredito que com a Implementação do RenovaBio ajudará retomada investimento em etanol e bioeletricidade. Conforme cenários do RenovaBio   há potencial estimado para ampliar em 52%, até 2030, a geração de bioeletricidade pelo setor, saindo dos 22,4 mil GWh gerados em 2019 para 34 mil GWh.

Canal: O RenovaBio permitiu um maior interesse das unidades em gerar energia? Por quê?

Zilmar: O crescimento esperado para a produção de etanol e da moagem de cana associada deve estimular também a expansão da geração de energia elétrica para a rede pelas usinas sucroenergéticas, até por conta de etanol e Bioeletricidade serem produtos coirmãos e sinergéticos no portfólio das usinas.

Canal: Há previsão de crescimento para os próximos anos?

Zilmar: Mesmo com o RenovaBio é preciso estimular a maior participação da bioeletricidade na matriz elétrica brasileira, com uma política mais ousada de contratação no ambiente regulado, com o reconhecimento dos atributos desta fonte renovável, e o fortalecimento do mercado livre de energia elétrica.

Em 2010, a biomassa, chegou a representar 32% do crescimento anual da capacidade instalada no país. Neste ano deve-se instalar 309 MW novos. Para 2024, a previsão é instalar apenas 41 MW novos, representando somente 1% da expansão da capacidade instalada no território nacional.

Canal: Qual a importância do “Selo Energia Verde”?

Zilmar: Criado em 2015, o Programa de Certificação da Bioeletricidade é a primeira iniciativa do tipo no mundo, que procura a certificação para a energia produzida estritamente a partir da biomassa da cana-de-açúcar. O projeto é uma iniciativa da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) em parceria com a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e apoio da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel).

O Certificado Energia Verde é concedido a usinas produtoras de bioeletricidade sucroenergética, que cumprem quesitos ambientais e de eficiência energética, e o Selo Energia Verde é concedido, sem custo, para consumidores e comercializadoras de energia no mercado livre. Atualmente, estamos com 61 usinas sucroenergéticas com o Certificado Energia Verde três comercializadoras em análise para obtenção do Selo Energia Verde. A renovação dos certificados e selos é anual.

O Programa de Certificação da Bioeletricidade tem sido importante para os consumidores e comercializadoras demonstrarem sua preocupação com o consumo responsável de energia elétrica, adquirindo energia renovável de usinas sucroenergéticas que apresentam indicadores de eficiência energética em sua geração de Bioeletricidade para a rede.

Canal: A bioeletrecidade gerada  a partir da cana é a quarta fonte mais importante da matriz energética brasileira. O que falta para se tornar uma das primeiras?

Zilmar: Para diminuirmos o hiato entre a geração efetiva de bioeletricidade e seu potencial é importante uma política setorial estimulante e de longo prazo, com diretrizes claras e de continuidade. Um breve diagnóstico do que contribuiu para um crescimento menor da geração para a rede está descrito, bem como as perspectivas para cada um destes tópicos capazes de retomarmos uma geração mais significativa nos próximos anos:

• Redução da demanda a contratar nos leilões regulados a partir de 2014:a retomada da economia é importante e  bioeletricidade sempre responde rapidamente, ajudando na garantia sustentável do suprimento;

• Falta da valoração adequada dos atributos das fontes: espera-se que processo de modernização do setor elétrico trate mais adequadamente os atributos nos leilões e  desenvolva um mercado de atributos ambientais

• Exclusão da biomassa de importantes leilões: conjunto relevante dos atributos da biomassa deve propiciar que fique mais competitiva, conforme processo de modernização avance. Evitar a exclusão da biomassa como aconteceu nos recentes leilões dedicados apenas para carvão e gás

• Judicialização no Mercado de Curto Prazo (MCP): a biomassa é bastante prejudicada com a judicialização. Precisa resolver: cassação das liminares ou solução via Congresso.

Cejane Pupulin-Canal-Jornal da Bioenergia

 

 

 

Veja Também

Perspectivas e desafios para a safra de cana 2024-2025: Entrevista com Martinho Seiiti Ono, CEO da SCA Brasil

Segundo o CEO da SCA Brasil,  Martinho Seiiti Ono, a safra atual de cana-de-açúcar tem …