Entrevista | Erasmo Battistella –Aprobio

Erasmo Battistella, além de presidir a Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil (Aprobio) é vice-presidente de Promoção de Eventos da Associação Brasileira dos Produtores de Canola (Abrascanola) e membro da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Oleaginosas e Biodiesel; do Conselho da Competitividade – Energias Renováveis.

Canal: O aumento gradativo da mistura de biodiesel para 9% e 10%, respectivamente, a partir de 1º de março de 2018 e 1º de março de 2019 são marcos para a produção nacional?

Erasmo Battistella: É parte do que o setor sempre buscou: previsibilidade e aumento na participação do biodiesel na matriz energética. Com o caminho respaldado, fica muito mais fácil para o setor como um todo traçar estratégias e buscar investimentos.

Não queremos apenas aumentar a participação do produto na cesta verde da matriz energética veicular do país, mas fazê-lo dentro de um ambiente de normalidade programada por um planejamento de longo prazo, para que possamos ao menos ter uma ideia de onde estaremos daqui a 20 ou 30 anos, com um conjunto claro de regras, que confira segurança jurídica e regulatória que assegure um ambiente propício aos investimentos.

 Canal:  Os produtores em geral têm como atender essa nova demanda?

Erasmo Battistella: O setor está pronto e apto para isso. Atualmente temos 51 plantas autorizadas pela ANP para operar com uma capacidade produtiva de quase 7,5 bilhões de litros por ano. Após a aprovação do aumento escalonado de mistura até B10 o mercado voltou a se movimentar, com usinas aumentando suas capacidades de produção ou solicitando autorização à ANP para ampliá-la. Ha ainda  pedidos para construção de usinas. Só com o B8, válido a partir do início de março  passado, o país deve contabilizar um aumento de demanda na ordem de 12% sobre 2016, para aproximadamente 4,3 bilhões de litros, caso o consumo de diesel permaneça estável. Porém, o setor produtivo ainda espera que a entrada do B9 possa ser antecipada para 2017. Além disso, a Aprobio integra a Mesa de Abastecimento de Biodiesel, fórum criado pelo Ministério de Minas e Energia para reforçar o diálogo do órgão com o setor e seus diversos agentes, com o objetivo de reduzir assimetrias de informação entre os diversos eixos, além de avaliar periodicamente o abastecimento de biodiesel e as variações envolvendo safra e entressafra.

Canal: Quanto o Brasil produz de biodiesel? Ele se destaca no mercado internacional?

Erasmo Battistella: A produção de biodiesel em 2015 foi de 3,937 bilhões de litros e no ano passado foi de 3,801 bilhões de litros, devido à queda no consumo de diesel, números que ressaltam o momento econômico do país. Apesar desse cenário, o país continua sendo o 2º maior produtor de biodiesel perdendo apenas para os EUA, que produziu 5,9 bilhões de litros em 2016.

Canal: O que o novo percentual de mistrua, B8, representa para a economia brasileira?

Erasmo Battistella: Representa mais empregos, renda e saúde.  Além de reduzir as emissões de gases de efeito estufa(GEE) e melhorar as emissões dos veículos diesel, a produção de biodiesel traz benefícios econômicos e sociais para todo o país, sobretudo às regiões onde estão as usinas. A maior parte delas está instalada em cidades pequenas e médias, principalmente no centro-sul do país. Em muitos destes municípios é possível verificar um aumento no PIB industrial e de serviços após a instalação da usina, uma sinal de geração de emprego e renda. A produção de biodiesel, para o mercado da soja, estimula o processamento do grão no país, gerando emprego e renda. O produto principal dessa industrialização, o farelo, é componente principal das rações preparadas para o gado leiteiro e principalmente para as criações de aves e suínos. A indústria de biodiesel agrega ainda mais valor ao produto original, soja, e suas unidades fabris estão entre as que mais empregam no país. No caso do sebo bovino, além de grandes frigoríficos, existem as graxarias que processam sobras de animais e também separam o sebo. A atividade agrega valor à gordura, que antes era rejeito e passou a ser considerada como mais um produto pelos frigoríficos.

Canal: A Aprobio acompanha os testes  que visam um aumento gradual na mistura de biodiesel ao diesel para 10 e depois 15 por cento. Como estão os testes?

Erasmo Battistella: A Aprobio tem participado desse processo. A Associação acredita que toda e qualquer verificação seja necessária para garantir a qualidade e a manutenção do programa, bem como, auxiliar na antecipação dos prazos para aumento gradativo da mistura. Embora, conforme o trabalho publicado pelo MAPA em 2015 – Usos de Biodiesel no Brasil e no Mundo – os blends já tenham sido motivo de teste,  aprovação e utilização em várias partes do mundo.

Canal: Qual a perspectiva de crescimento da produção de biodiesel no Brasil?

Erasmo Battistella: Para os próximos anos o setor de biodiesel deve crescer na ordem de 10%. Em outubro de 2016, o setor entregou ao secretário de Petróleo, Gás e Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia, Márcio Félix, trabalho que consta do RenovaBIO, com dados que apontam que a participação do biodiesel na Matriz Energética Brasileira pode alcançar pelo menos 3,31% em 2030, com uma produção de 18 bilhões de litros por ano.

Canal: Com o crescimento da produção  quantas vagas de emprego devem ser geradas?  Há mão de obra qualificada?

Erasmo Battistella: Estudo da FIPE de 2012 indicava que com o aumento da mistura, à época B5, para B10 o incremento do emprego poderia chegar a 205 mil. A previsibilidade já destacada fará com que a mão de obra qualificada esteja disponível quando necessária.

Canal: A nova mistura traz quais benefícios para o meio ambiente ?

Erasmo Battistella: As vantagens são evidentes e transversais, perpassando vários segmentos, sobretudo economia, saúde pública e meio ambiente,  de maneira a fazer de um a consequência do outro. Estudo encomendado pela Aprobio à Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE/USP), sobre o impacto econômico da produção de biodiesel no período de 2008 a 2011, mostrou que o maior uso do biocombustível naqueles anos evitou a emissão de 11 milhões de toneladas equivalentes de gás carbônico (CO²). Outro estudo preparado para a Aprobio, desta vez sobre os efeitos do combustível renovável na natureza desde a plantação das matérias-primas para seu processamento até a combustão nos motores, constatou que a redução de CO² em toda a cadeia produtiva pode superar os 70%. Estudos similares chegaram a resultados semelhantes.

O biodiesel contribui para o país cumprir as metas de redução de emissões de gases de efeito estufa assumidas nas conferências do clima das Nações Unidas desde a COP-15, em Copenhagen em 2009, até a Conferência COP 21 em Paris, em dezembro do ano passado, a ponto de constar das propostas da delegação brasileira nas duas ocasiões. A Câmara Setorial de Oleaginosas e Biodiesel do Ministério da Agricultura fez um relatório em 2013 mostrando que cada ponto percentual a mais de biodiesel nos tanques de combustível corresponde a plantar sete milhões de árvores.

A consultoria ambiental Saúde e Sustentabilidade pesquisou os efeitos do aumento do emprego de biodiesel para reduzir a poluição atmosférica nas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte e Recife. Realizado com apoio da APROBIO e suporte técnico da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, o trabalho mostrou que o uso progressivo de biodiesel reduz o número de internações hospitalares por problemas respiratórios. Também mostrou que se na Região Metropolitana de São Paulo a mistura de B20 fosse utilizada, nós teríamos praticamente duas mortes a menos por dia.

 

Cejane Pupulin-Canal-Jornal da Bioenergia

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