Ricardo Steckelberg é consultor da Steckelberg Consultoria. Engenheiro mecânico pela Universidade de Brasília (UnB), com MBA em gestão de projetos pela Fundação Getúlio Vargas, MBA Agroenergia pela ESALQ/Universidade de São Paulo (USP) e curso de balanço de massa e energia em usinas de açúcar pelo Audubon Sugar Institute (Estados Unidos). Foi gerente de projeto de implantação da usina termelétrica (UTE) Jalles Machado S/A, da UTE Codora Energia. e da Unidade Otávio Lage, ambas da Jalles Machado, elaborando o projeto, implantação, start-up e operação. Ao longo da carreira atuou na regulagem de moendas para diversas usinas no Estado de Goiás e no México.
Canal: Em 2016, há otimismo para o setor sucroenergético?
Apesar do momento atual que passamos, com crise política e financeira, acredito que teremos um cenário positivo para as usinas do setor. Alguns fatores ainda decorrentes de 2015, como o aumento da mistura de etanol na gasolina de 25% para 27%, o restabelecimento parcial da CIDE, alterações do ICMS para alguns estados e os reajustes de preços feitos pela Petrobrás contribuiram para melhorar a competitividade do etanol perante a gasolina e isso alavancou o setor.
Embora o consumo de combustíveis tenha uma queda prevista entre 5% e 6% (nos dois primeiros meses deste ano a queda foi de 3%), é importante o etanol se tornar mais competitivo para manter ou aumentar o consumo em relação à safra anterior.
Na questão do açúcar, o consumo mundial começou a superar a produção e o Brasil, como líder, terá uma perspectiva melhor do que 2015. Acredito que algumas usinas que não produziram açúcar em 2015 vão reativar suas fábricas e as que diminuíram vão voltar aos níveis de produção anteriores. Estima-se um crescimento de 12,5% (segundo informações da Datagro) na exportação de açúcar para a safra 2016/17 em função da redução da produção asiática e a possibilidade de exportação para a Europa recuperar seus níveis de estoques.
Enfim, apesar da crise nacional, me parece que o setor está se recuperando. Vemos isso em algumas usinas que estão ampliando tanto na matéria-prima quanto na indústria e, apesar dos investimentos ainda serem tímidos, pois são com recursos próprios, acreditamos que estamos diante de uma boa expectatvia.
Canal: De que forma uma base confiável de dados pode nortear e fazer um comparativo de eficiência e custos para as usinas?
“Aquilo que não se pode medir, não se pode melhorar”. O autor desta frase é um físico irlandês chamado William Thomson, conhecido como Lord Kelvin, criador do “zero absoluto” e da unidade de temperatura do sistema internacional de medidas – a escala Kelvin de temperatura. Esta frase aliada à do Gato Risonho, em Alice no País das Maravilhas: “Para quem não sabe aonde vai, qualquer caminho serve” reflete uma realidade nas empresas. Empresas que não possuem uma base de dados que reflita a realidade técnica e financeira e não apresentam metas estão fadadas a enfrentar situações constragedoras.
Com metas técnicas e financeiras bem estabelecidas, é necessária uma boa base de dados para acompanhar e melhorar os indíces dessas metas. Além disso, é imprescindível que haja um benchmarking interno e externo para servir de referência, se posicionar internamente com seus próprios índices e externamente com os índices das usinas, principalmente as que são referência no mercado e bem conceituadas.
Mesmo quando uma usina apresenta altos índices de eficiência e custos baixos, ela deve ficar atenta e validar sua base de dados. Certamente alta eficiência e custos baixos não implicam que uma empresa obtenha bons resultados financeiros. É sempre muito importante que o empresário tenha uma equipe competente e comprometida e ferramentas que permitam informações fidedignas para tomadas de decisões.
Canal: Por causa do endividamento das usinas, a manutenção industrial pode ter sido deixada de lado em alguns momentos. O que isso pode representar para o desempenho industrial dessas usinas nesta safra?
Imagine alguém que está desempregado mas tenha que utilizar um carro e suas reservas são suficientes apenas para o combustível. Ele não tem capital para manutenção periódica, troca de óleo, correias, filtros, amortecedores e outras manutenções periódicas indicadas pelo fabricante do veículo. Paralelo a isso, ele sofre pequenas batidas na carenagem do carro, não leva em um lanterneiro deixando que vários amassados prejudiquem a aparência e a vida dessa carenagem. Vazamentos vão aparecendo e quando há alguma quebra que impeça o veículo de movimentar, ele procura peças usadas e o mecânico mais barato. É fácil concluir que este veículo está caminhando para o “sucateamento” e a recuperação, no final, ficará mais cara do que um veículo novo. Essa analogia vem de encontro com o que está a acontecendo em algumas usinas. O primeiro departamento a ser extinto é o PCM – Planejamento e Controle de Manutenção. Perdem-se bons profissionais e históricos riquíssimos em informações sobre os equipamentos e começa o quebra-conserta de acordo com as surpresas. Conserta-se apenas o necessário para “rodar”. Estruturas vão ficando sem pintura, tubulações com vazamentos e nenhum tipo de controle e manutenção preventiva é feita, apenas a corretiva gerando paradas inesperadas, prejuízos no processo, risco de não cumprir contratos de fornecimentos, aumento do custo de produção para citar algumas consequências. O desempenho de uma usina e a sua eficiência são extremamente dependentes de uma moagem constante e firme. Neste estado, o processo de produção agradece e se ajusta buscando o seu melhor índice de produtividade, os custos caem e, obviamente, os lucros aumentam.
Canal: Existem novas tecnologias e equipamentos industriais que podem garantir aumento de produtividade das usinas? Os custos são elevados?
Os equipamentos de uma maneira geral evoluíram muito com máquinas de geração por controle numérico e também com empresas que buscaram excelência na fabricação destes equipamentos. Os processos também evoluíram através de pesquisas, empresas que se dedicaram a inovar certos processos e os equipamentos destes processos. Estas tecnologias estão disponíveis no mercado e sua aplicação depende do conhecimento da consultoria e da ousadia do empresário em sair do tradicional e buscar eficiência através da tecnologia e equipamentos industriais de última geração. Não podemos esquecer que também está disponível a instrumentação e automação praticamente sem limite para os processos, o que proporciona ganhos de eficiência. Claro que tudo isso tem seu custo mas é necessário fazer um estudo de viabilidade de longo prazo para verificar o retorno do investimento.
Canal: De que forma a usina deve trabalhar para tentar minimizar os prejuízos em época de crise?
Uma receita que nunca falhou é o treinamento dos colaboradores. Reduzir o quadro de funcionários é importante, mas deve-se tomar o cuidado de selecionar com muito critério quem deve permanecer. Pessoas comprometidas e criativas não podem ser sacrificadas em prol dos mais próximos da alta administração.
Em época de crise, quando não há mais gordura para se queimar, é necessário um bom controle do processo, evitar retrabalhos e perdas no processo. É necessário medir bem o que entra na usina em termos de matéria-prima e o que sai de produtos finais. Sem um bom controle intermediário através de pessoas capacitadas, treinadas e comprometidas isso é praticamente impossível.
Canal: De que forma uma consultoria especializada contribui para a produtividade dentro da usina?
A vantagem da consultoria é ter a oportunidade de conhecer várias usinas e olhar a empresa, de certa forma, isenta dos vícios, costumes e tradições intrínsecas dos processos e pessoas que a compõe. Seu conhecimento e isenção podem trazer bons resultados, pois consegue evidenciar pontos importantes de oportunidades de ganhos de eficiência e produtividade. Estes ganhos vão depender muito do estado evolutivo de cada empresa e da receptividade do corpo técnico, seja na indústria ou agrícola, e é necessário estudar caso a caso.
Ana Flávia Marinho=Canal-Jornal da Bioenergia