Opinião/Célula a combustível movida a etanol, a grande inovação

De forma nem sempre aparente, as tecnologias automotiva e de combustíveis tem caminhado lado-a-lado com o objetivo de oferecer desempenho, eficiência e emissões controladas. O automóvel e o combustível não existem de forma isolada. Por décadas, a especificação de combustíveis se adaptou para atender limites de emissão de gases poluentes e condições de combustão mais apropriadas, assim como foram criadas tecnologias automotivas com o objetivo de aumentar o desempenho, reduzir o consumo e as emissões. A preocupação com o meio ambiente, inicialmente focada na emissão de gases poluentes nos grandes centros urbanos, passou a incorporar a preocupação com emissões de gases causadores do efeito estufa.

Apesar dos avanços a realidade é que, em grande medida, ainda convivemos com uma tecnologia básica que converte de forma ineficiente o poder calorifico contido nos combustíveis líquidos em movimento. Nos motores a combustão interna do ciclo Otto, a eficiência termodinâmica é 25%, nos do ciclo Diesel de 29%. O restante é em grande parte desperdiçado na forma de calor, e por este motivo os motores são feitos de ferro fundido, os carros são feitos de aço, e precisam incorporar pesados sistemas de refrigeração para dissipar calor.

A solução é conhecida pela indústria automobilística há décadas. A tendência é a adoção do veículo elétrico, pois a eficiência do uso da eletricidade é muito maior. Mas surge aí a questão sobre a origem da eletricidade, pois de nada adianta se for gerada com a queima de combustível fóssil. Surge também a preocupação com o que fazer com as baterias, que tem uma vida útil relativamente curta, e seu descarte gera preocupações ambientais. Há ainda a necessidade de investimento em sistemas de distribuição de eletricidade ou de troca de baterias para trajetos mais longos.

O graal tem sido a célula a combustível, um sistema que é conceitualmente o de um carro elétrico, mas que pode ser abastecido com combustível liquido, ou hidrogênio puro. No caso de usar combustível líquido, a reforma ou separação do hidrogênio seria realizada a bordo do veículo. A reação do hidrogênio e do oxigênio gera eletricidade e água. A eficiência termodinâmica é mais do que o dobro do motor atual.

Muitos recursos foram dedicados ao desenvolvimento de tecnologias nesta direção. Algumas soluções foram desenvolvidas para veículos movidos a hidrogênio, mas é caro para ser produzido, difícil de ser armazenado e distribuído, e enfrenta um risco inerente a sua natureza explosiva, requerendo um controle rigoroso e um passivo potencial significativo.

Neste contexto, é de grande importância o desenvolvimento por uma montadora japonesa da célula a combustível movida a etanol, que segundo a montadora resolve o problema de infraestrutura do hidrogênio. O etanol é valorizado pelo elevado teor de hidrogênio em sua molécula. Isso significa que o Brasil, ao dispor de um sistema de distribuição de etanol já instalado num país de dimensão continental, resolveu o desafio de distribuir hidrogênio de forma econômica e segura.

A nova tecnologia permitirá que o consumo dos veículos caia substancialmente, e irá valorizar os combustíveis pelo seu teor de hidrogênio. Mais do que nunca, será importante determinar a origem e o ciclo de vida de cada combustível. A tecnologia automotiva está indicando um caminho de valorização do etanol e do sistema de distribuição criado no Brasil para este combustível. Como o etanol de cana tem emissão de carbono próxima de zero, esta pode ser a solução definitiva para o atingimento das metas ambientais da COP21. Com o etanol, o Brasil está à frente na solução de mobilidade com sustentabilidade.

 

Plínio Nastari é presidente da Datagro, foi presidente do Conselho da AEA, Associação Brasileira de Engenharia Automotiva.

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