A Comissão de Infraestrutura (CI) do Senado aprovou terça (6/6) o Projeto de Lei (PL) 1425/2022 que dá os primeiros passos na regulação da captura e armazenamento de carbono (CCS, na sigla em inglês) no Brasil.
Uma atividade que pode render até US$ 20 bilhões às empresas brasileiras e já tem atraído interesse de petroleiras e produtores de etanol.
O texto que segue para votação terminativa da Comissão de Meio Ambiente (CMA) define, entre outras coisas, que as atividades de armazenamento permanente serão exercidas mediante simples termo de outorga do governo federal para exploração dos reservatórios geológicos.
E dá preferência de acesso à infraestrutura de armazenamento ao agente com projetos já desenvolvidos, e com capacidade de descarbonizar suas próprias atividades.
Medida que faz sentido para a FS, produtora de etanol de milho, que tem hoje o projeto mais avançado de CCS no Brasil, para injetar o carbono da produção em Lucas do Rio Verde (MT) na bacia do Parecis
“Para fazer o CCS, o empreendedor tem que ter a segurança que aquele espaço poroso que ele vai precisar para estocar o CO2 vai ter exclusividade de direito acesso. Não pode ter o risco de ter outras atividades, mesmo depois da cessação do projeto, que possam de alguma forma interferir, [causando risco de] vazamento do CO2 que foi estocado”, explica Milas Evangelista, CEO da Renovar Sustentabilidade.
Milas é consultor da FS no projeto. A empresa recebeu a primeira autorização da ANP para perfuração de um poço não para prospecção de óleo e gás, mas avaliação das condições geológicas para injeção do carbono. Trabalho está previsto para os próximos meses.
A FS está contratando empresas de serviço de óleo e gás para o projeto que também representou uma inovação na ANP. Sem um marco legal e a competência explícita para regular a atividade, a agência enquadrou o poço como uma atividade de fomento do conhecimento geológico. Ainda não é o aval para a injeção futura do CO2.
Pagando a conta
Embora não veja um ambiente favorável para subsídios federais ao CCS no Brasil, o especialista aponta alguns outros caminhos para remuneração dos projetos.
“O Brasil acaba indo meio a reboque do que ocorre em outros países. O mercado criado nos EUA pode criar uma janela de oportunidade para exportar o produto para lá, ou eventualmente adquirir crédito de carbono e fazer a transação no mercado regulado ou voluntário”.
E aí, o produto brasileiro tem uma vantagem em relação ao dos EUA: aqui, a pegada de carbono é menor porque a energia usada na produção é renovável. Lá, os produtores ainda dependem de gás natural.
Já em termos de incentivos, o consultor lembra que a política de biocombustíveis, RenovaBio, prevê um bônus ao produtor com pegada de carbono negativo na emissão dos créditos de descarbonização (CBIOs).
“O produtor de biocombustível que demonstrar que tem um balanço de carbono negativo tem uma bonificação de 20% na nota de eficiência. Sem fazer BECCS (bioenergia com CCS) ninguém vai conseguir ficar negativo”.
Mas para ser viável, é preciso que a ANP inclua o BECCS na RenovaCalc (ferramenta que calcula a intensidade de emissões da produção).
Tendência de hubs
Estudo da McKinsey indica que, até 2050, a captura de carbono precisa aumentar 120 vezes em relação aos níveis atuais e alcançar 4,2 bilhões de toneladas por ano.
Um desafio e tanto, considerando os altos custos para capturar, transportar e armazenar o gás, a necessidade de desenvolver infraestruturas e regulações, e os riscos de capital associados.
Não à toa, a solução que as companhias encontraram para reduzir riscos e custos é a associação em hubs para compartilhar a infraestrutura.
Atualmente, existem 15 hubs no mundo, em vários estágios de desenvolvimento. Mas a McKinsey sugere que cerca de 700 clusters poderiam ser estabelecidos globalmente.
“É uma tendência real. Europa, Arábia Saudita e Estados Unidos estão fazendo. Tem alguns projetos na indústria de etanol nos Estados Unidos sendo desenvolvidos. Agora, isso tudo vai depender do outro lado da história que é a remuneração. Os Estados Unidos hoje têm uma regulação com incentivo fiscal que paga esse investimento”, comenta Milas.
Nos EUA, a Lei de Redução da Inflação (IRA) do governo de Joe Biden, oferece incentivos na forma de créditos fiscais de até US$ 85 por tonelada de CO2 capturado pelas empresas.
Essas políticas farão com que os EUA hospedem quase metade da capacidade de CCS do mundo até 2030, de acordo com a BloombergNEF.
Etanol versus O&G. Enquanto no etanol o custo para identificar um site adequado para fazer a gestão do CO2 é elevado, a captura do gás é mais barata porque o processo de fermentação para produzir biocombustível permite o resgate de um CO2 com 98% de pureza para armazenamento.
Por outro lado, a indústria de petróleo está aproveitando uma oportunidade por já ter esse conhecimento geológico das bacias sedimentares onde as empresas operam, especialmente em campos já depletados. Mas os custos com tecnologia e insumos são altos.
Hubs para o etanol brasileiro?
Segundo Milas, uma coincidência na indústria brasileira de etanol é que a maior parte da produção do biocombustível de cana está em cima da bacia do Paraná.
Com 1,3 milhões de quilômetros quadrados em uma região que pega Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina, e tem até 8 mil metros de espessura.
“Você tem uma coincidência da fonte geradora de CO2 com a possibilidade de ter condição ideal de estocagem geológica. [Com] essa concentração de usinas existe o potencial de formação de hubs de injeção”.
Esse potencial também se estende à bacia do Parecis, no Mato Grosso, onde está localizada a maior parte das usinas de etanol de milho – e onde a FS estuda seu projeto de CCS –, mas tudo dependerá da economicidade dos projetos. EPBR